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quinta-feira, agosto 28, 2008

nuvem etiquetada


aquela aquele casa com como criança
dava de dedos dentro depois dia dos durante
e era eram esquecidos
folha frase fundo isso janelas lado livro lua
não nenhum
no num onde páginas palavra
para parágrafo por porque quarto que
sem ser si sol tinham
um uma vez

poemanuvem a partir de quarto com vista para dentro (epifania do livro), originalmente publicado aqui e da autoria de 1-2-3-4-5 aranhiças & elefantes

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quarta-feira, agosto 27, 2008

lugar para o outro lado


jp

do fim do mundo as coisas são os objectos perto dos olhos. a distância sem medo deu em tudo o que nunca os olhos viram quando se abriram pela primeira vez. e antes de nascer viram as coisas do fim do mundo.

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sexta-feira, agosto 22, 2008

azul

o azul que eu queria era o azul de lado nenhum. o azul parecido com o céu mas em que o céu não está lá. o azul da cor impossível que fica por ver quando olhamos sem usar os olhos e o azul dos olhos que nunca vi. o azul com que acordo na janela na manhã perfeita é o azul dos sonhos que não têm cor por não me lembrar a cor coisa alguma do sonho, mas a certeza do azul tenho de ter estado dentro do sonho e o ter sentido, ao azul, como se fora a última das cores, a última das ilusões antes dos olhos abrirem e para sempre ficarem a procurar o azul último dos sonhos. o azul que eu queria ver era o azul que eu não tenho por não se poder ter este azul como se podem ter as outras cores, por não ser uma cor de ter mas uma cor de ver por dentro dos olhos. o azul de ter é outro azul com cor que é parecido com muitos azuis e até com o azul da terra vista do espaço. mas não é esse o meu azul que não é meu, só o chamo meu porque dele falo e me dói falar porque deste azul não se fala nunca por não ser o azul uma palavra. este azul entre as letras que vejo com os olhos que não são azuis e que por isso conseguem ver o azul entre as palavras, está escondido dentro da folha branca de papel e é o azul de outro céu entre os dedos que escrevem, tendo assim ficado como o azul a cor infinita da folha de papel que, nas outra cores, é branca. o azul que eu queria era o azul de quando as noites são da meia-noite e não têm azul outro a não ser o que fica do dia e o da noite misturados. parece depois o azul o escuro do céu mas é nessa meia-noite a mistura dos dois azuis que são o fundo em forma de cor de alguns sonhos antes da madrugada. a madrugada também de azul. o azul que não existe no céu, só existe na madrugada, nas coisas a acontecer como no princípio sempre. no princípio era o azul que não é a cor.

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pequeno deus


jose navarro

deus pequeno no teu lugar, a erma tarde para sempre inacabada e o teu silêncio em mim. os olhos dos outros em todo o lado, o dia último que te procurava, o teu silêncio outra vez, nós no silêncio do mundo. tu, a solidão ao mesmo tempo que tu, debruçando-te os olhos na tarde, e quase seres como os outros, como tu, como as crianças outras todas, a criança. tu, a obra de ti, os astros maiores que aqueles, o sonho quase verdade desses astros, a alquimia de ti nesse espaço profundo que é aqui e em todo o lado, o mito dentro de ti, as tuas mãos, a tua suprema criação. agora, então depois, a inevitável deserção na descoberta de um lugar possível que não queres, não, das crianças o espaço, as outras crianças que não tu. criança, criança, deus de ti serás, e depois de nós, quase amantes, quase o céu ainda que habitas nesse pôr-do-sol que te viu à solta nos olhos dos outros, assim seremos os dois sentados, a restar à beira de um segundo em que não mais serás tu por causa dos outros, nem os outros os outros, nem ninguém mais ninguém, só tu, criança de ti, deus de ti e dos teus astros. de mim também. deus pequeno, escrevo-te de agora e aqui o silêncio é o de nunca mais haver ruídos, e é tão mais perfeito que os outros, e é esse sonho quase impedido nos teus olhos, que os meus viram nos teus, que vejo por fim. criança, escrevo-te agora e não há mais nada. só estas palavras depois a escrever a tua história de tudo teres criado e que é a de ninguém porque é a de todos, minha e tua também, nossa de não ser, e dos teus astros que criaste e que são os astros de todos e te observam na noite de longe a jazer pendurados no profundo, enquanto tu dormes e eu escrevo. a ficção de então sermos, escrevo.

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segunda-feira, agosto 18, 2008

estória


(IV)

A. que tudo sabia por ter entrado na sombra e nela ter sabido os segredos, regressava. os segredos imperfeitos sem palavras a compor o segredo final que estava no fim do caminho que era da luz das árvores feito. no escuro as árvores postas no chão brilhavam contra o céu da noite do regresso que não tinha estrelas. as estrelas na noite outra imaginadas para sempre porque nunca mais as veria A. o regresso não tinha estrelas porque só tinha a luz das árvores mortas por dentro a fulgir em cortesia com o resto da noite escura. A. era as estrelas também a regressar à morte.

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quarta-feira, agosto 13, 2008

breve história da nudez

atsuhide ito

vesti as tuas últimas roupas por cima do meu corpo para então me sentir nu, apenas vagamente despido, por dentro só, nesse embaraço de não ter nada com que me tapar. no entanto encoberto, demasiado, quase sem mim, escondido debaixo do tecto sem mais tecto nenhum que em cima me imitasse o céu, principiei a fugir para outro lugar distante da minha nudez, a nudez do meu próprio corpo vestido de ti, no desconcerto do corpo sem o corpo, à mercê de si próprio, excessivo e ávido de não ser mais nada a não ser isso mesmo, corpo desmesurado. assim precipitando-se para a Génese, teu e meu em contratempo, o corpo esqueceu-se depois da nudez que tão somente o destapava por estar debaixo do tecto sem céu em ti. na espontânea aparição do nascimento que era o corpo a aperceber-se de si, algures tu ao mesmo tempo que eu na minha nudez feita de ti, o céu seria por fim o conhecimento acidental por mim do corpo sem mim, portanto eu próprio a regressar condenado ao meu lugar sem céu, nu.*


*-Texto originalmente publicado em Minguante #11

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