sábado, julho 23, 2005
quarta-feira, julho 20, 2005
Alien convida...JC
Crash (não confundir com o título homónimo de Cronenberg), para além de grande exercício dramatúrgico, é um filme estilizado, com uma permissa e estrutura a fazer lembrar Magnólia, de P.T. Anderson, Traffic, de Soderberg, ou ainda Grand Canyon, de Kasdan, na forma como um cruzamento de histórias vai pintando um quadro geral, neste caso, rácico.
Através de uma matriz já conhecida (o filme começa com uma sequência à qual se seguem um desfiar de memórias analépticas das várias personagens). Haggis consegue desmontar, de forma metódica e por vezes obsessiva, as manifestações do racismo no quotidiano americano.
Com um cast de luxo, bem à Hollywood, estes actores conseguem fugir aos estereótipos onde as suas carreiras assentam (principalmente Sandra Bullock e Brendan Fraser), não pelo brilhantismo dramático dos papéis, mas pelo halo invisível criado entre o realizador e a sua câmara. De facto, Haggis, até há bem pouco tempo um desconhecido produtor e argumentista (escreveu o argumento de Million Dollar Baby, nomeado ao Óscar), consegue disfarçar uma falta de protagonismo evidente (exceptuando, talvez, um bem regressado Matt Dillon), ajudando o espectador a esquecer os intérpretes, focando-se unicamente nas personagens, estas sim, complexas, não só porque nunca são reduzidas a uma única dimensão, mas também pela forma majestosa como um agressor pode ter a sua oportunidade de redenção no take seguinte.
Los Angeles é essencial, devido às suas características cosmopolitas, que a tornam um barril de pólvora no que respeita às questões raciais, não significando que o filme não pudesse ter sido feito em qualquer outra cidade norte-americana ou, quicá, mundial. No entanto, aqui é bem visível o fosso social existente, criando a ideia de um apartheid dentro de uma só cidade.
Quanto ao argumento, escrito também por Haggis, mostra-se tão fiel à realidade, dando a impressão que estamos perante uma torrente de “dejá vú” constante. É cruel e realista, sem ser uma lição de moral. Haggis tenta consciencializar o espectador para a culpa intrínseca de compartimentalização social da sociedade em que coexiste. Tendo como estória transversal o conflito racial, o panorama argumentativo é muito mais amplo, chamando a atenção para a desresponsabilização actual, as barreiras da consciência, a impermeabilidade de escrúpulos cada vez mais torpes.
No cômputo geral, Crash é um murro no estômago de todos que, por múltiplos factores, mantém os olhos semi-cerrados diante de uma realidade demasiado gritante. Esta Colisão tem o mérito de imaginar uma teia dramática e poderosa que nos envolve e contagia com o seu tom de diagnóstico da alma humana. Sem falsas demagogias.
O Melhor – A cara dos espectadores enquanto o genérico final rola na tela. Inertes.
O Pior – O timming do filme, acabando por passar despercebido numa época de praia e blockbusters.
JC*
*- jovem crítico cinematográfico de gaveta
Através de uma matriz já conhecida (o filme começa com uma sequência à qual se seguem um desfiar de memórias analépticas das várias personagens). Haggis consegue desmontar, de forma metódica e por vezes obsessiva, as manifestações do racismo no quotidiano americano.
Com um cast de luxo, bem à Hollywood, estes actores conseguem fugir aos estereótipos onde as suas carreiras assentam (principalmente Sandra Bullock e Brendan Fraser), não pelo brilhantismo dramático dos papéis, mas pelo halo invisível criado entre o realizador e a sua câmara. De facto, Haggis, até há bem pouco tempo um desconhecido produtor e argumentista (escreveu o argumento de Million Dollar Baby, nomeado ao Óscar), consegue disfarçar uma falta de protagonismo evidente (exceptuando, talvez, um bem regressado Matt Dillon), ajudando o espectador a esquecer os intérpretes, focando-se unicamente nas personagens, estas sim, complexas, não só porque nunca são reduzidas a uma única dimensão, mas também pela forma majestosa como um agressor pode ter a sua oportunidade de redenção no take seguinte.
Los Angeles é essencial, devido às suas características cosmopolitas, que a tornam um barril de pólvora no que respeita às questões raciais, não significando que o filme não pudesse ter sido feito em qualquer outra cidade norte-americana ou, quicá, mundial. No entanto, aqui é bem visível o fosso social existente, criando a ideia de um apartheid dentro de uma só cidade.
Quanto ao argumento, escrito também por Haggis, mostra-se tão fiel à realidade, dando a impressão que estamos perante uma torrente de “dejá vú” constante. É cruel e realista, sem ser uma lição de moral. Haggis tenta consciencializar o espectador para a culpa intrínseca de compartimentalização social da sociedade em que coexiste. Tendo como estória transversal o conflito racial, o panorama argumentativo é muito mais amplo, chamando a atenção para a desresponsabilização actual, as barreiras da consciência, a impermeabilidade de escrúpulos cada vez mais torpes.
No cômputo geral, Crash é um murro no estômago de todos que, por múltiplos factores, mantém os olhos semi-cerrados diante de uma realidade demasiado gritante. Esta Colisão tem o mérito de imaginar uma teia dramática e poderosa que nos envolve e contagia com o seu tom de diagnóstico da alma humana. Sem falsas demagogias.
O Melhor – A cara dos espectadores enquanto o genérico final rola na tela. Inertes.
O Pior – O timming do filme, acabando por passar despercebido numa época de praia e blockbusters.
JC*
*- jovem crítico cinematográfico de gaveta
segunda-feira, julho 18, 2005
Slowdive às rodelas
No mais pequeno gesto, revela-se o rumor que cosemos com fio de aço na permanência do espírito. Na pergunta, revelamos o gosto que temos pela dúvida e pela sonora incerteza da matéria que nos provoca no rompimento, entre a fina bruma da espécie e a incompreensível consistência das coisas. Às vezes, um buraco é uma cisterna provocadora, imerecida, sossegada no pensamento de um motor atrasado, no tempo, no virar da consciência e da silenciosa opção pela verdade e pela entrega que descobrimos no imprevisto. Escutadas as vozes da impossível prontidão, o destino carrega-se de memórias antecipadas, num virar inseguro dos segundos, dos minutos e das horas. E depois mais tarde, experimentamos furar os olhos, de rajada, com a cabeça e a carapaça, enquanto esperamos que, no dia a seguir, acordemos, ressacados, esmagados pela luz da pertinência.
segunda-feira, julho 11, 2005
sexta-feira, julho 08, 2005
domingo, julho 03, 2005
apólice do medo
Sabia que ia morrer e que deixava o casaco pendurado na porta que dava para a sala. Sabia que o estranho pensamento é uma insegurança imaginária, pertença de obstáculos sofredores e devedores. Sabia que não voltava e que a memória não é sempre curta, podendo esta ter a duração de uma mitologia sufocada pelas artérias silenciosas do corpo.
Por fim desenhou um quadrado com uma seta lá dentro a apontar para cima. A direcção indeterminada sofreu alterações. Ele próprio não sabia qual era a que queria.
Porque ninguém sabe ainda.