Alien convida...JC
Crash (não confundir com o título homónimo de Cronenberg), para além de grande exercício dramatúrgico, é um filme estilizado, com uma permissa e estrutura a fazer lembrar Magnólia, de P.T. Anderson, Traffic, de Soderberg, ou ainda Grand Canyon, de Kasdan, na forma como um cruzamento de histórias vai pintando um quadro geral, neste caso, rácico.
Através de uma matriz já conhecida (o filme começa com uma sequência à qual se seguem um desfiar de memórias analépticas das várias personagens). Haggis consegue desmontar, de forma metódica e por vezes obsessiva, as manifestações do racismo no quotidiano americano.
Com um cast de luxo, bem à Hollywood, estes actores conseguem fugir aos estereótipos onde as suas carreiras assentam (principalmente Sandra Bullock e Brendan Fraser), não pelo brilhantismo dramático dos papéis, mas pelo halo invisível criado entre o realizador e a sua câmara. De facto, Haggis, até há bem pouco tempo um desconhecido produtor e argumentista (escreveu o argumento de Million Dollar Baby, nomeado ao Óscar), consegue disfarçar uma falta de protagonismo evidente (exceptuando, talvez, um bem regressado Matt Dillon), ajudando o espectador a esquecer os intérpretes, focando-se unicamente nas personagens, estas sim, complexas, não só porque nunca são reduzidas a uma única dimensão, mas também pela forma majestosa como um agressor pode ter a sua oportunidade de redenção no take seguinte.
Los Angeles é essencial, devido às suas características cosmopolitas, que a tornam um barril de pólvora no que respeita às questões raciais, não significando que o filme não pudesse ter sido feito em qualquer outra cidade norte-americana ou, quicá, mundial. No entanto, aqui é bem visível o fosso social existente, criando a ideia de um apartheid dentro de uma só cidade.
Quanto ao argumento, escrito também por Haggis, mostra-se tão fiel à realidade, dando a impressão que estamos perante uma torrente de “dejá vú” constante. É cruel e realista, sem ser uma lição de moral. Haggis tenta consciencializar o espectador para a culpa intrínseca de compartimentalização social da sociedade em que coexiste. Tendo como estória transversal o conflito racial, o panorama argumentativo é muito mais amplo, chamando a atenção para a desresponsabilização actual, as barreiras da consciência, a impermeabilidade de escrúpulos cada vez mais torpes.
No cômputo geral, Crash é um murro no estômago de todos que, por múltiplos factores, mantém os olhos semi-cerrados diante de uma realidade demasiado gritante. Esta Colisão tem o mérito de imaginar uma teia dramática e poderosa que nos envolve e contagia com o seu tom de diagnóstico da alma humana. Sem falsas demagogias.
O Melhor – A cara dos espectadores enquanto o genérico final rola na tela. Inertes.
O Pior – O timming do filme, acabando por passar despercebido numa época de praia e blockbusters.
JC*
*- jovem crítico cinematográfico de gaveta
Através de uma matriz já conhecida (o filme começa com uma sequência à qual se seguem um desfiar de memórias analépticas das várias personagens). Haggis consegue desmontar, de forma metódica e por vezes obsessiva, as manifestações do racismo no quotidiano americano.
Com um cast de luxo, bem à Hollywood, estes actores conseguem fugir aos estereótipos onde as suas carreiras assentam (principalmente Sandra Bullock e Brendan Fraser), não pelo brilhantismo dramático dos papéis, mas pelo halo invisível criado entre o realizador e a sua câmara. De facto, Haggis, até há bem pouco tempo um desconhecido produtor e argumentista (escreveu o argumento de Million Dollar Baby, nomeado ao Óscar), consegue disfarçar uma falta de protagonismo evidente (exceptuando, talvez, um bem regressado Matt Dillon), ajudando o espectador a esquecer os intérpretes, focando-se unicamente nas personagens, estas sim, complexas, não só porque nunca são reduzidas a uma única dimensão, mas também pela forma majestosa como um agressor pode ter a sua oportunidade de redenção no take seguinte.
Los Angeles é essencial, devido às suas características cosmopolitas, que a tornam um barril de pólvora no que respeita às questões raciais, não significando que o filme não pudesse ter sido feito em qualquer outra cidade norte-americana ou, quicá, mundial. No entanto, aqui é bem visível o fosso social existente, criando a ideia de um apartheid dentro de uma só cidade.
Quanto ao argumento, escrito também por Haggis, mostra-se tão fiel à realidade, dando a impressão que estamos perante uma torrente de “dejá vú” constante. É cruel e realista, sem ser uma lição de moral. Haggis tenta consciencializar o espectador para a culpa intrínseca de compartimentalização social da sociedade em que coexiste. Tendo como estória transversal o conflito racial, o panorama argumentativo é muito mais amplo, chamando a atenção para a desresponsabilização actual, as barreiras da consciência, a impermeabilidade de escrúpulos cada vez mais torpes.
No cômputo geral, Crash é um murro no estômago de todos que, por múltiplos factores, mantém os olhos semi-cerrados diante de uma realidade demasiado gritante. Esta Colisão tem o mérito de imaginar uma teia dramática e poderosa que nos envolve e contagia com o seu tom de diagnóstico da alma humana. Sem falsas demagogias.
O Melhor – A cara dos espectadores enquanto o genérico final rola na tela. Inertes.
O Pior – O timming do filme, acabando por passar despercebido numa época de praia e blockbusters.
JC*
*- jovem crítico cinematográfico de gaveta
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